segunda-feira, 24 novembro, 2025
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Na COP30, plenária dos povos denuncia violações e cobra ação climática urgente

Na plenária final dos povos, no último dia da COP30, em meio aos impasses nas negociações, povos e movimentos levantaram denúncias de violência e desigualdade, exigindo decisões que protejam vidas e territórios

Na reta final da COP30, a sexta-feira (21), foi marcada pela Plenária Final dos Povos, com a presença de representações de movimentos populares de várias partes do mundo para denunciar guerras, violência, expulsão de comunidades, ataques a defensoras e defensores ambientais e o avanço de falsas soluções como instrumentos de aprofundamento das desigualdades. Jovens, mulheres, povos indígenas, organizações sociais e sindicatos relataram violações, criticaram a militarização do evento e cobraram que as negociações climáticas assumam compromissos reais, centrados na proteção de territórios, na justiça climática e na defesa dos direitos humanos.

A presidenta da CUT Pará, Vera Paoloni, falou em nome do movimento sindical internacional e se tornou um dos destaques da plenária. Em um discurso emocionado, lembrou que a ofensiva da extrema direita e do fascismo tem ameaçado democracias e cooperações, com efeitos diretos sobre quem luta em defesa do clima, da vida e dos territórios.

“Enquanto o fascismo e a extrema direita estiverem amedrontando as nossas cooperações, nós precisamos fortalecer as organizações de luta, os sindicatos, as ONGs, as associações, os que lutam pelos climas, pelos povos originários, pelos povos indígenas, pelas mulheres que estão na base da pirâmide, cuidando da vida, cuidando do planeta”, afirmou.

Vera ainda destacou a urgência de proteger defensoras e defensores ambientais e sindicais. “Nós precisamos proteger as lideranças sindicais, as lideranças ambientais, os guardiões da terra, dos direitos, das populações, porque aqueles que sujam nossos rios, derrubam nossas florestas, são os mesmos que exterminam a liderança e exterminam o direito social, o direito dos povos, o nosso direito de ser feliz”, disse a dirigente.

 

Relevância da plenária

A Plenária do Povo, espaço historicamente consolidado dentro da Conferência das Partes, foi realizada pelas organizações que que compõem a Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima (em inglês, United Nations Framework Convention on Climate Change – UFCCC).

São elas a TUNGO (compostas por sindicatos), YOUNG (juventude), IPO (povos indígenas), WGC (mulheres e gênero) e o Disability Caucus, grupo informal que advoga pela inclusão de pessoas com deficiência na política climática. Conhecidos como eleitorados, esses grupos permitem que organizações não governamentais (ONGs) com interesses comuns colaborem e apresentem suas perspectivas de forma mais organizada.

A sessão da Plenária foi aberta com uma forte ênfase na solidariedade internacional, especialmente com Palestina, Sudão e Congo. Jesus Vasquez, coordenador-geral da organização na região do Caribe, declarou solidariedade “com todos os povos, especialmente aqueles que têm sofrido muito, como nossos camaradas da Palestina”.

A representação do Sudão levou ao plenário a dimensão humanitária da guerra que já deslocou 12 milhões de pessoas. Passados dois anos e sete meses de conflito, o país continua “sangrado em silêncio, sem receber a atenção internacional necessária”. Também foi relatado que os corpos das mulheres seguem sendo utilizados como arma de guerra, evidenciando a violência sexual sistêmica que marca o conflito.

A sudanesa Roaa Ahmed recebeu aplausos de pé ao narrar a destruição de sua casa durante a guerra e denunciar a violência sexual contra meninas e jovens mulheres. Seu testemunho sintetizou o que representantes africanos, latino-americanos e asiáticos reforçaram: não há justiça climática possível sem cessar-fogo, proteção humanitária e enfrentamento das desigualdades raciais e de gênero

Em nome dos palestinos, Tarok Mustafa, que perdeu 77 integrantes de sua família em Gaza, afirmou: “Eu não vim para recontar a dor. Eu vim para carregar a responsabilidade”. Ele relacionou militarismo e crise climática, enfatizando que “se o militarismo fosse um país, ele seria o quarto maior emissor na Terra” e reforçou: “Não podemos fazer greenwash do genocídio”, defendendo o fim da impunidade global.

Os organizadores apresentaram ainda os resultados da Cúpula dos Povos, espaço autônomo que reuniu mais de 70 mil pessoas em marcha e mais de 20 mil em plenárias, formulando uma declaração conjunta segundo a qual o modo de produção do capital é a “principal causa da crescente crise climática”. O documento denuncia racismo ambiental, ausência de reparações e rejeita “quaisquer falsas soluções para a crise climática”, especialmente aquelas que mantêm práticas prejudiciais e desviam atenção das respostas baseadas na justiça popular.

O encontro também trouxe apresentar demandas específicas. Jovens criticaram a militarização da COP, relatando que “entramos neste edifício em vans militares e grandes armas como se a própria justiça fosse o crime”.

Também pediram a libertação de defensoras e defensores ambientais indígenas, como o Dr. Malachi, preso por protestos pacíficos. A Via Campesina Global, definindo-se como anti-internalista, anti-capitalista, anti-patriarcal e anti-colonial, chamou por reparações e reiterou sua mensagem central: “Estamos dizendo mudança de sistema, não mudança climática”, rejeitando colonialismo verde, capitalismo social e geoengenharia.

Pela primeira vez, o Disability Caucus integrou o debate, denunciando a negação do status de constituição ao grupo, a inacessibilidade persistente das COPs e a exclusão de linguagem de visibilidade nos textos de negociação. O grupo lembrou que as guerras agravam as dificuldades para pessoas com deficiência vindas de zonas de conflito, reafirmando o lema: “Nada sobre nós sem nós”.

Papel do Brasil

Dirigentes de redes civis internacionais afirmaram que por ser sede da maior floresta tropical do mundo, o Brasil assume responsabilidades adicionais na COP30. Defensores de direitos sociais e ambientais defenderam a criação de mecanismos para responsabilizar empresas poluidoras, garantir transição energética justa e assegurar financiamento adequado para países historicamente impactados sem terem contribuído proporcionalmente para a crise climática.

Representantes de povos indígenas e juventudes lembraram que o aumento da temperatura já ultrapassa limites seguros em várias regiões e que comunidades tradicionais enfrentam simultaneamente avanço do garimpo, queimadas criminosas, perda territorial e ataques diretos contra lideranças. “Afirmaram que uma COP só poderá ser considerada bem-sucedida quando colocar direitos humanos e direitos dos povos no centro”, disseram.

Resolução

A plenária foi encerrada com um compromisso coletivo que reconhece a insuficiência da ação governamental. Em canto unificado, participantes declararam: “Lutaremos mais arduamente. Trabalharemos mais rápido. Construiremos nossos movimentos e nosso poder. E iremos até o fim e nunca desistiremos”.

Os organizadores reforçaram que falsas soluções climáticas expressam a lógica de um “sistema capitalista, imperialista e colonial” e defenderam que o caminho adiante exige “organização, participação séria da sociedade, fortalecimento, unidade e internacionalismo”.

Mesmo sem acordo político no último dia da COP30, a Plenária Final dos Povos mostrou que as vozes dos territórios, das periferias, das juventudes, das mulheres e dos povos originários continuarão pressionando governos e corporações. Para seus participantes, apenas uma transição climática justa, feminista, antirracista e centrada nos direitos dos povos poderá enfrentar a crise que já atinge de forma desigual milhões de pessoas no planeta.

Escrito por: André Accarini

Foto/Crédito: Fernando Vivaldo/CUT

Fonte: https://www.cut.org.br/noticias/na-cop30-plenaria-dos-povos-denuncia-violacoes-e-cobra-acao-climatica-urgente-32fd

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