79 dias depois da criação do grupo de trabalho (GT) que discutiu uma proposta de reforma administrativa na Câmara dos Deputados, os trabalhadores e trabalhadoras ainda não sabem o que pretendem os articuladores da reforma. Até esta sexta-feira, 15 de agosto, o coordenador do GT, deputado Pedro Paulo (PSD-RJ), ainda não apresentou o relatório e os projetos que vem discutindo a portas fechadas com o presidente da Câmara e grande entusiasta da reforma, Hugo Motta (REP-PB).
Motta criou o GT em 28 de maio. O grupo debateu durante 45 dias medidas relativas aos serviços públicos. Ao longo desse período, Pedro Paulo foi diversas vezes à imprensa falar sobre o tema, mas sempre de forma genérica, sem especificar medidas concretas. Em suas entrevistas, geraram especial preocupação sinais sobre a liberação de contratações temporárias sem limites, sobre mudanças na carreira e sobre possível utilização das avaliações de desempenho para enfraquecer a estabilidade dos servidores e servidoras. Até mesmo a redução de salários do funcionalismo, com proporcional redução da jornada, apareceu em entrevistas de Pedro Paulo.
De concreto, porém, ao longo do mês e meio de trabalho do grupo, nada foi divulgado. A falta de transparência em um tema que afetará não apenas servidores e servidoras, mas o conjunto da população, que precisa de serviços públicos de qualidade, faz aumentar a sensação de que virão ataques graves. Especialmente se considerarmos que entidades empresariais atuaram fortemente no entorno do GT.
Apresentação a portas fechadas e novos adiamentos
Em dado momento dos trabalhos do GT, o deputado Pedro Paulo comprometeu-se a apresentar o relatório final no dia 14 de julho. Não só adiou a apresentação para o dia 15, como não o fez publicamente. Em mais uma demonstração de que a sociedade está apartada do debate pelo Congresso, Pedro Paulo apresentou seu relatório apenas ao presidente da Câmara. Ao público, voltou a citar nada mais do que intenções genéricas, em entrevista coletiva no mesmo dia.
Na ocasião, Pedro Paulo disse que sua intenção era aprovar as medidas já em agosto. Disse ainda que antes da apresentação pública pretendia debater os textos com os líderes do Congresso e com o Executivo federal. Conforme Pedro Paulo, estão prontos o relatório final e três anteprojetos: uma proposta de emenda à Constituição (PEC), um projeto de lei complementar (PLP) e um projeto de lei ordinária (PL).
A nova promessa do coordenador do GT era de que divulgaria publicamente o relatório e os anteprojetos nessa quinta-feira, 14 de agosto. Isso não aconteceu. E também não aconteceu nesta sexta, 15, um mês depois da apresentação a Motta e da entrevista coletiva. Assim, 79 dias depois da instalação do GT a sociedade ainda não conhece as reais intenções das discussões que estão sendo feitas a portas fechadas.
O que consta no relatório e nos anteprojetos?
O que se sabe até o momento é o que foi adiantado por Pedro Paulo na entrevista coletiva. Esses anteprojetos não incluem tudo o que está presente no relatório. O coordenador disse que o GT fez um “diagnóstico amplo” de pontos que têm sido debatidos na sociedade e na imprensa. Esses pontos estão no relatório, mas não necessariamente nos anteprojetos. Temas como o dos super salários serão objeto de outros anteprojetos apenas se o conjunto de líderes assim decidir, disse o deputado.
Conforme Pedro Paulo, não será discutido o “tamanho do Estado”, nem “elementos de ajuste fiscal”, embora isso não impeça que “se reorganize pontos do orçamento”. Ainda segundo o coordenador do GT, “não tem uma vírgula de retirada de direitos de servidores” e “não há uma vírgula da PEC 32”. Ele disse que, na apresentação a Motta, incluiu uma imagem em que a PEC 32 é colocada em um cesto de lixo.
São 66 propostas, que não foram detalhadas, mas incluem temas como “governança, gestão e governo digital”, assim como “meritocracia e planejamento estratégico com indicadores e metas”. Consta também a criação de um concurso nacional unificado que inclua estados e municípios, bem como a divulgação de uma tabela salarial única dos servidores e servidoras. E a instituição de mecanismos de avaliação de desempenho, que também não foram detalhadas.
Libera geral nas contratações temporárias
Um aspecto que gera preocupação é o foco em ampliar contratações temporárias. Ao longo de toda a discussão no GT, Pedro Paulo deu diversas declarações defendendo a liberação desse tipo de contratação para além do que é permitido hoje – atualmente, mesmo que sejam utilizadas forma de burlá-la, a legislação determina que esse tipo de contratação só pode ser feito em situações de “excepcional interesse público”. A ideia, com a reforma, é criar até mesmo um cadastro nacional de contratações temporárias, com um processo simplificado disponível tanto no nível federal quanto para estados e municípios.
Essa flexibilização das contratações para o serviço público coloca em risco os concursos públicos e aprofunda um tipo de contrato com menos direitos, menores salários e pior para a prestação dos serviços públicos. Em nota, o Ministério da Gestão e da Inovação disse que “defende a estabilidade e é contra qualquer flexibilidade com relação aos vínculos de contratação; para temporários e terceirizados a agenda do MGI é de ampliação de direitos; a contratação de temporários, por exemplo, deve ficar restrita a situações temporárias e não ser usada para atividades permanentes”.
Foto/Crédito: Câmara dos Deputados/Mário Agra
Fonte: https://sintrajufe.org.br/coordenador-do-gt-da-reforma-administrativa-segue-sem-apresentar-relatorio-propostas-sao-debatidas-a-portas-fechadas-com-motta/