Em janeiro de 2025, esses valores representavam 43,6% da remuneração líquida da magistratura
O gasto com verbas indenizatórias — valores usados para ressarcir despesas de magistrados — passou de R$ 7 bilhões em 2023 para R$ 10,5 bilhões no ano passado, o equivalente a uma alta de 49,3%, segundo um estudo feito pelo Movimento Pessoas à Frente.
Parte dessas verbas é de penduricalhos — adicionais pagos fora do teto constitucional e classificados indevidamente como indenizatórios. Essa classificação equivocada faz com que os valores fiquem, de forma indevida, fora do cálculo do teto constitucional (hoje de R$ 46.366,19) e da base de cálculo do Imposto de Renda (IR). Em janeiro deste ano, os penduricalhos representavam 43,6% da remuneração líquida da magistratura.
A pesquisa mostra que o rendimento líquido dos magistrados subiu de R$ 45 mil (2023) para quase R$ 55 mil (2024) — e bateu R$ 66.400 em fevereiro de 2025.
— A verba indenizatória deve ter caráter reparatório, ser eventual e passar por análise de cada caso. O CNJ (Conselho Nacional de Justiça) poderia regulamentar — diz Jessika Moreira, diretora do Movimento.
Entidade diz que PL dos supersalários vai criar ‘efeito cascata’
Outro risco apontado no estudo é o Projeto de Lei 2.721/2021, em tramitação no Senado, que prevê 32 exceções ao teto constitucional. Segundo o Movimento Pessoas à Frente, ao menos 14 dessas exceções são classificadas de forma indevida como indenizatórias.
— Se esse projeto for aprovado, trará um dano enorme. Ele institucionaliza penduricalhos e pode gerar um efeito cascata em todo o serviço público — alerta Jessika.
Apenas quatro das exceções previstas — como auxílio-alimentação e gratificação por acúmulo de função — representariam um impacto de R$ 3,4 bilhões em 2025
Jessika lembra ainda que o tema pode ser enfrentado na Reforma Administrativa:
— Temos apresentado várias propostas ao grupo de trabalho da reforma.
O que diz o CNJ
Procurado, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) afirmou que a aplicação do teto constitucional no Judiciário é regulamentada por suas Resoluções 13/2006 e 14/2006, que detalham as verbas excluídas:
“A Corregedoria Nacional de Justiça é responsável por acompanhar, apurar e determinar a suspensão de casos irregulares de pagamento a magistrados e servidores do Judiciário. Ou seja, os salários são fixados por cada Tribunal, e o CNJ exerce um controle posterior e examina eventual ilegalidade”.
O CNJ argumentou ainda que cada Tribunal tem autonomia administrativa e financeira e pode elaborar e encaminhar suas propostas de orçamento, respeitados os limites da lei de diretrizes orçamentárias.
“No âmbito da União, ao menos desde 2017, os órgãos do Poder Judiciário respeitam limites individualizados impostos pela legislação e que obstam o crescimento das despesas. Sem prejuízo disso, é comum que os órgãos do Poder Judiciário da União devolvam ao Tesouro recursos orçamentários não executados’, completou.
O órgão declarou ainda que “o Poder Judiciário brasileiro é um dos mais informatizados e produtivos do mundo, apesar de ter um número de juízes por habitante inferior à média da Europa e o maior número de advogados por habitante do planeta”.
“Fazer justiça em um contexto de elevada judicialização da vida, num território continental e ainda marcado por grandes desigualdades sociais é um desafio que requer estrutura compatível, completou.
No entendimento do CNJ, muitos pagamentos de passivos são relativos a decisões judiciais que deram ganho de causa a esses profissionais para o recebimento desses valores.
Em relação ao PL 2.721/2021, o conselho afirmou que “não cabe ao CNJ comentar projetos em tramitação”.
Ajustes propostos segundo o estudo
Gratificação por lei
O Movimento Pessoas à Frente propõe uma série de medidas para o fim dos supersalários. Uma delas acaba com a prática de criação de benefícios por atos internos. Auxílios e adicionais devem ter base legal aprovada pelo Congresso Nacional.
Cobrança de IR
Outra proposta é a aplicação adequada da incidência de Imposto de Renda sobre adicionais pagos a servidores. Muitas dessas verbas escapam da tributação por serem registradas como indenizatórias, mesmo quando têm natureza remuneratória. A coalizão defende a reclassificação para garantir justiça fiscal e aumento na arrecadação. “Verbas com natureza salarial não podem continuar isentas”, diz Eduardo Couto, líder de conhecimento do Movimento Pessoas à Frente.
Regras de transparência
Mais uma solução sugerida é a exigência de transparência total nos dados de remuneração do funcionalismo, tanto com divulgação espontânea (ativa) quanto mediante solicitação via Lei de Acesso à Informação (passiva). O Movimento Pessoas à Frente apontou dificuldade obter dados do Ministério Público durante o levantamento.
Criação de benefícios
O veto à criação de qualquer adicional por ato administrativo também está entre as propostas. Auxílios e gratificações só poderiam ser instituídos por leis aprovadas no Congresso, impedindo que órgãos ampliem vencimentos de forma unilateral.
Efeito cascata
Também está previsto o fim da vinculação automática entre os subsídios dos ministros do STF e os vencimentos de outros servidores do Judiciário. Hoje, quando o teto sobe, há aumentos automáticos em série.
Supersalários como improbidade
Pagamentos acima do teto sem respaldo legal passariam a ser enquadrados como ato de improbidade administrativa, segundo a proposta da coalizão. A medida tem o objetivo de criar uma sanção clara para quem autoriza esse tipo de gasto.
Foto/Crédito: STF / Divulgação
Fonte: https://extra.globo.com/economia/servidor-publico/noticia/2025/07/penduricalhos-verbas-indenizatorias-irregulares-aumenta-supersalarios-no-judiciario-aponta-estudo.ghtml