Case de Inteligência Artificial do TRE-PA é premiado como destaque máximo no EXPOJUD LATAM 2025
O Tribunal Regional Eleitoral do Pará (TRE-PA) conquistou o 1º lugar no EXPOJUD LATAM 2025, evento que reúne tribunais de toda a América Latina para compartilhar experiências inovadoras no Judiciário.
O projeto vencedor, intitulado “Inspirar e ir além: a jornada de soluções do TRE do Pará com IA”, demonstra como a Inteligência Artificial vem sendo aplicada para otimizar rotinas internas, agilizar processos e melhorar os serviços prestados à sociedade.
Durante a apresentação, o destaque foi o MIA-SEI, módulo de Inteligência Artificial integrado ao Sistema Eletrônico de Informações (SEI), capaz de gerar automaticamente documentos oficiais e reduzir a burocracia. Também foram apresentadas outras soluções desenvolvidas pela equipe do tribunal, como:
BERTHEX – assistente de IA para apoio aos mesários;
KAREN – chatbot jurídico de atendimento;
TAIA – central de suporte via WhatsApp;
Gen[IA] – ferramenta de consultas inteligentes em dashboards.
A representação do tribunal ficou a cargo do secretário de Tecnologia da Informação, Felipe Brito, que, em entrevista exclusiva ao Sindjuf-PA/AP, celebrou a conquista e ressaltou o papel essencial dos servidores no processo de inovação:
Sindjuf-PA/AP – Como você recebeu a notícia de que o TRE do Pará conquistou o 1º lugar no EXPOJUD LATAM 2025? Qual foi sua primeira reação?
Felipe Brito – Recebi com muita alegria e um sentimento genuíno de gratidão. Ver o TRE do Pará ser reconhecido como referência em diferentes áreas tem sido motivo de muito orgulho. Temos participado de prêmios, congressos e também sediado grandes eventos, e em todos esses espaços nossos cases se destacam por serem inovadores, pioneiros e, acima de tudo, criativos.
É gratificante perceber que a tecnologia tem sido, para nós, mais do que ferramenta: tem sido refúgio. A própria realidade amazônica nos desafia a buscar soluções ousadas, inclusivas e sustentáveis, e isso tem nos impulsionado a construir um modelo de Justiça digital comprometido com as pessoas.
Quando o troféu chegou, meus filhos, Luiza e Felipe, pediram que eu esperasse por eles para abrir a caixa. E assim fiz. Um gesto simples, mas que traduz tudo o que essa conquista representa. Porque, no fim, somos servidores. Somos humanos. E esse reflexo que vem daquilo que construímos juntos transforma não apenas o serviço prestado ao cidadão, mas a nossa própria essência. Inspira dentro de casa e fora dela.
Sindjuf-PA/AP – O case premiado, “Inspirar e ir além”, trata de soluções com Inteligência Artificial. Pode nos contar como essas soluções estão sendo aplicadas no dia a dia do Tribunal?
Felipe Brito – O TRE do Pará foi o primeiro Tribunal Regional Eleitoral do Brasil a contratar oficialmente soluções de Inteligência Artificial generativa, com enfoque duplo: tanto para o desenvolvimento de aplicações personalizadas, por meio do ambiente Google GCP, quanto para o acesso individual de todos os usuários a uma console de IA generativa, com segurança e uso institucional. Enquanto alguns órgãos ainda estão na fase de testes e provas de conceito, aqui nós já estamos com soluções em uso real e contratos ativos, com resultados concretos.
O TRE do Pará escolheu trilhar um caminho ousado e responsável no uso da Inteligência Artificial. Não se trata apenas de acompanhar uma tendência. O que temos feito é estruturar uma estratégia sólida e institucionalizada, que une inovação tecnológica com respeito à realidade dos servidores e às necessidades da sociedade.
De um lado, desenvolvemos soluções próprias, como o MIA, TAIA, BERTHEX e GenIA, já aplicadas ao nosso dia a dia e que estão integradas a sistemas e processos reais do Tribunal. De outro, implementamos uma política clara de democratização do acesso à IA generativa, contratando uma plataforma segura e corporativa — o Google Gemini — e oferecendo ciclos contínuos de capacitação para todos os servidores, de todas as áreas. Esse investimento vem criando, na prática, uma cultura organizacional de IA, acessível, aplicada e coletiva.
O objetivo é que os servidores possam usar essas ferramentas para alavancar suas atividades, automatizar o que é repetitivo, ter mais tempo para o que realmente importa: dialogar, se reunir, prestar um atendimento mais humano, pensar melhorias, olhar para o futuro da Justiça Eleitoral. Estamos falando de mais produtividade, sim, mas também de mais qualidade de vida, mais segurança e mais inteligência no trabalho.
E há um passo importante prestes a ser dado com o lançamento do módulo de IA para o SEI, que vai permitir a servidores redigirem ofícios, despachos e memorandos com base em sua própria atuação histórica no sistema, de forma personalizada, com revisão sempre feita por quem conhece o processo. Isso representa ganho de tempo real, redução de carga repetitiva e melhora direta na entrega final.
Além disso, cada nova solução desenvolvida pelo TRE do Pará passa a contar com elementos inteligentes incorporados desde sua concepção, como a capacidade de oferecer respostas mais precisas, interações mais intuitivas e funcionalidades que vão além do previsto. Essa é a essência do nosso projeto: usar tecnologia para transformar, sem perder a centralidade no humano.
Sindjuf-PA/AP – Você destacou (para a ASCOM do Tribunal) que o reconhecimento é fruto do esforço coletivo da equipe. Pode nos falar sobre o papel dos servidores na implementação dessas soluções tecnológicas?
Felipe Brito – Sem dúvida, o protagonismo dos servidores do TRE do Pará é o que torna cada projeto uma entrega real e transformadora. Nenhuma inovação nasce de uma única cabeça. Cada linha de código, cada insight, cada funcionalidade implementada, tem o DNA de pessoas comprometidas, criativas e dispostas a construir algo que vá além do esperado.
Nossa equipe da STI vem trabalhando de forma colaborativa, respeitosa e incansável para que cada solução desenvolvida reflita as necessidades reais da Justiça Eleitoral e das pessoas que a integram. A inteligência artificial, no nosso caso, não é uma abstração: é uma ferramenta moldada por servidores, para servidores, e isso faz toda a diferença.
Esse reconhecimento nacional, com o primeiro lugar no EXPOJUD LATAM, é um reflexo direto da confiança, da escuta ativa e da valorização da expertise técnica dos nossos colegas, que muitas vezes enxergam o problema antes dele aparecer e propõem caminhos que superam expectativas. E o mais importante: fazem isso com brilho nos olhos e com um sentimento legítimo de pertencimento.
Mais do que premiar um case, esse resultado celebra uma cultura organizacional que acredita nas pessoas como motor da inovação, e que sabe que tecnologia só tem sentido se melhorar a vida de quem está dentro e fora do Tribunal.
Sindjuf-PA/AP – Quais foram os maiores desafios que a equipe enfrentou para transformar essas ideias em resultados concretos?
Felipe Brito – Durante muito tempo, a Inteligência Artificial habitava o mundo das ideias. Os algoritmos estavam prontos, os modelos bem descritos, mas ainda distantes da realidade da Justiça Eleitoral. O que faltava era o ambiente adequado: grande volume de dados, infraestrutura acessível e cultura institucional para adoção. Esse era o abismo entre a teoria e a prática.
O primeiro desafio, portanto, foi romper com a inércia institucional — a crença de que IA era algo inalcançável para o serviço público. Em 2019, o TRE do Pará tentou desenvolver um chatbot para atendimento ao eleitor, mas a tecnologia da época não proporcionava uma experiência satisfatória. O projeto foi interrompido, e a pandemia redirecionou as prioridades.
A virada começou em 2023, com o surgimento das IA generativas. Um evento conduzido pelo ministro Luís Roberto Barroso, no STF, propôs o uso da IA para resumir processos judiciais. A proposta inspirou a equipe a imaginar algo semelhante no SEI. Ainda durante o fechamento do cadastro eleitoral daquele ano, surgiram as primeiras conversas que dariam origem ao Módulo de IA do SEI, começando com uma prova de conceito baseada em resumos automáticos.
A partir daí, vieram marcos importantes:
- Provas de conceito durante as eleições, incluindo chatbot com IA generativa;
- Capacitação técnica em agosto de 2024, com foco em desenvolvimento e integração de IA;
- E, principalmente, a contratação oficial da IA generativa, que fez do TRE do Pará o primeiro TRE do Brasil a dar esse passo institucional — tanto para desenvolvimento de soluções com o Google Cloud Platform, quanto para o uso individual com a console do Gemini distribuída a todos os servidores.
Esse duplo investimento em tecnologia e pessoas transformou a cultura da STI. Hoje, a IA generativa está presente não apenas na Coordenadoria de Sistemas, mas permeia todas as áreas — inclusive com a recente solução de hiperautomação em segurança da informação, desenvolvida internamente, que já desperta interesse em outros tribunais.
Essa transformação não substitui o humano — ela potencializa. Como alguém que antes levaria 50 dias para atravessar uma floresta e hoje conta com um veículo moderno, continua sendo a mesma pessoa, mas com novas possibilidades. A IA generativa é esse veículo. Servidores que antes enfrentavam dificuldades para revisar processos extensos, redigir ofícios ou compreender rapidamente o histórico de um caso, agora contam com ferramentas que ampliam sua capacidade de entrega, eficiência e compreensão.
Esse é o verdadeiro impacto da IA generativa: ela nos coloca à frente, sem tirar nossa humanidade. E é essa cultura que já se consolidou na STI e, esperamos, contamine positivamente toda a organização.
Sindjuf-PA/AP – Que impacto essas inovações já trouxeram para o trabalho dos servidores e para o atendimento ao público?
Felipe Brito – O impacto é transformador porque já deixou de ser uma aposta futura: está no presente. Um exemplo claro foi nas eleições de outubro de 2024, quando uma IA generativa foi disponibilizada para atender dúvidas dos mais de 80 mil mesários da Justiça Eleitoral Paraense. Embora não tenhamos estatísticas completas de uso, sabemos que ela realizou algo que seria humanamente impossível no dia do pleito: estar disponível, 24h por dia, para todos os mesários, com respostas precisas, contextualizadas e sem fila de espera.
Na outra ponta, com apoio técnico da Corregedoria Regional Eleitoral, também criamos uma solução inédita de IA para orientar chefes de cartório e magistrados quanto à propaganda eleitoral, consolidando jurisprudência e rotinas administrativas com linguagem acessível.
Em cibersegurança, agentes inteligentes já operam no apoio à triagem de alertas e relatórios, usando linguagem natural para compreender e descrever incidentes. Os painéis Gen[IA] que já permitem questionamentos diretos sobre orçamento, pessoas, recursos, TIC e relatórios, sem a necessidade de navegar entre sistemas ou planilhas, ou desenvolver novas consultas.
Outros exemplos vêm das ferramentas cotidianas de produtividade. O Google Workspace, por exemplo, já permite aos servidores gerar resumos automáticos de reuniões, auxílio na construção, pesquisa e resumo de e-mails, usar a IA nas planilhas e documentos, montar grandes bases de leis, decisões anteriores, modelos com NotebookLM, transcrever sessões, audiências e outros vídeos e áudios com acurácia, e montar análises complexas com poucos cliques — tudo isso com o uso de linguagem natural.
O que antes era um esforço de dias, agora é possível em minutos. Mas não basta apenas ter tecnologia de ponta. Como dizemos aqui: não adianta ter um caça se ninguém souber pilotar. Por isso, estamos investindo em cultura, capacitações, trocas de experiência e projetos como o STI on the River, para que esse conhecimento chegue a toda a organização.
Essa revolução silenciosa já está em curso e, de certo, seguirá contaminando positivamente todas as áreas do Tribunal.
Foto/Crédito: CNJ