Uma nova ameaça de reforma administrativa retorna ao cenário político brasileiro. A PEC 38, em discussão no congresso nacional, traz novamente a pauta da diminuição e modernização do estado. Mas essa não é a primeira tentativa. Em 2020, a bola da vez era PEC 32 colocada em trâmite no governo Bolsonaro, mas que não decolou. Já 2025, a PEC 38, é considerada prioridade para a gestão de Hugo Motta (Republicanos) na Presidência da Câmara que pretende tornar esse o grande marco da sua gestão.
Após meses de sigilo e debate em um grupo de trabalho da Câmara, a proposta foi apresentada oficialmente em outubro reunindo as 171 assinaturas necessárias para tramitar no Congresso Nacional. A fala do Presidente da Câmara Federal e do relator da proposta, Deputado Federal Pedro Paulo (PSD-RJ), é uníssona: combater privilégios, supersalários e não retirar direitos. Mas será isso mesmo?
Apesar do discurso sedutor, o famoso canto da sereia, o texto diz exatamente o contrário. A PEC promove drasticamente a diminuição do estado restringindo a realização de novos concursos e estimulando a terceirização. Os novos concursos agora só seriam realizados após estudos preliminares: orçamentários, de realocação de pessoas e digitalização de processos. A exigência de avaliar a terceirização antes da reposição cria um viés crônico a favor da terceirização, tornando as contratações temporárias preferenciais em relação aos quadros efetivos.
E isso tem algum impacto na sociedade brasileira?
Demais! A primeira questão é a ascensão social. A população mais pobre vê no concurso público uma possibilidade de ascensão e estabilidade na vida, garantindo acesso a bens antes improváveis como à compra da casa própria. Enquanto diminuição dos concursos e ampliação da terceirização impossibilitaria esse movimento.
Para os servidores em exercício a PEC 38 pode significar a perda salarial e o achatamento da carreira já que o projeto prevê carreiras sem a progressão por tempo de serviço, com mais de 20 níveis e teto salarial 50% superior ao salário base, em uma carreira nacional unificada.
Outra questão que impacta diretamente a qualidade e eficiência dos serviços é a retirada da estabilidade do servidor público, sendo fixada um período de 10 anos, e a definição de gestão de desempenho com critérios anuais e até a perda de cargo por avaliação periódica. Estimulando o assédio aos profissionais que não se submeterem aos pedidos de seus “superiores”. Lembremos aqui o caso das joias sauditas trazidas ilegalmente por Bolsonaro. O auditor fiscal sofreu diversas pressões de ministros de estado e do ex-presidente, mas manteve sua posição de trabalho. Em uma situação de vínculos mais precarizados o desfecho poderia ser outro. Outro caso emblemático aconteceu em São Paulo, onde viralizaram diversos vídeos de educandos dando nota 0 aos seus professores como forma de retaliação e vingança, a avaliação foi criada pelo Governo Tarcísio.
A sociedade, no entanto, não está calada. Os sindicatos de todo Brasil tem se unido nas ruas e nas redes em defesa do serviço público e dos servidores. Em Fortaleza, no início do mês de outubro, o Sindicato União dos Trabalhadores em Educação do Município de Fortaleza, Sindiute, iniciou a luta contra a reforma, organizando três dias de paralisação das atividades escolares. A ação se encerrou na Marcha Estadual Contra a Reforma Administrativa que reuniu sindicatos e servidores das três esferas, vindos de diversos locais do estado do Ceará, para a grande mobilização. A luta prosseguiu até Brasília para Marcha Nacional do Serviço Público Contra a Reforma Administrativa, que ocorreu dia 29 de outubro.
Esta pressão organizada fez com que 23 dos 171 Deputados Federais retirassem seu apoio à PEC 38, o que apesar de ser um sinalização do esvaziamento da pauta não tem efeito de suspensão da proposta. Enquanto isso, Hugo Motta e Pedro Paulo preparam um verdadeiro golpe, ao sinalizar que a proposta pode não passar pelas comissões sendo votada diretamente no plenário pelo mecanismo de “apensamento” em outra PEC com o tema semelhante.
Por isso, é necessário estarmos atentos e fortes, nas ruas e nas redes, organizados para barrar a PEC 38 e defender o patrimônio brasileiro, seus trabalhadores.
Autor: Alan Raymison. Professor de Educação Física da rede pública municipal de Fortaleza, diretor sindical do SINDIUTE e militante do Movimento Brasil Popular.





